Rodrigo
se abaixa e pega o diário, tenta lembrar-se de onde conhecia aquela capa, mas
antes de conseguir pensar em algo Catarina arranca-o de suas mãos e coloca
dentro da bolsa rapidamente.
– Vai
parecer estranho, mas já vi um diário desses em algum lugar, só não lembro
onde.
– Ah,
foi? Você deve tá confundindo com algum livro, esse diário foi... feito à mão,
pela minha vó.
– Não,
tenho certeza que já vi um desses!
– Que
estranho, ela nunca me falou sobre ter feito um desse pra outra pessoa.
– Sei...
Mas me diga senhorita, que horas posso passar pra te pegar sábado? – Rodrigo
diz em tom de graça e Catarina sorri aliviada por ter mudado o assunto.
– Que
gentil de sua parte, mas então senhor amigo da menina GO, ainda não sei se vou
aparecer por lá. – Rodrigo dá uma risada e logo fala:
– Ah,
qualé... É sua chance de se enturmar com a galera, fazer novos amigos, se
aproximar da gente e de quebra garantir autógrafos nossos, quer coisa melhor
pr'uma noite de sábado?
– É,
você não tem fortes argumentos, mas fiquei balançada com o lance dos
autógrafos, vai ser um prazer assinar meu nome na sua camisa, não se preocupe. –
Eles sorriem e Catarina se dá conta que já está na rua de casa. – Acho que
cheguei em casa, valeu pela carona, cavalheiro. A gente se vê amanhã?
Eles se
despedem e Catarina fica feliz em ver que ali poderia ter um laço de amizade
começando, há tempos não conversava com alguém com quem se entrosasse com
facilidade e o assunto fluísse assim. De imediato se pergunta de onde ele
reconheceu o diário, já que ninguém tem acesso à biblioteca secreta. Ao chegar
em casa, como ainda era cedo, nota que todos ainda estavam no trabalho. Entra
no quarto e senta na cama com o diário aberto decidida a encontrar algum
endereço ou vestígio de dados do suposto dono do diário, mas não encontra nada,
nenhuma assinatura, nenhum telefone, nenhum endereço! Resolve voltar à casa
secreta, decidida a encontrar alguma coisa que solucione esse mistério.
Procura
nas prateleiras próximas ao local em que encontrou o diário, revira vários livros,
abre outras caixas, mas nada... Não encontra nada. Abre o diário novamente e
com letras mais apagadas, um recorte de livro:
‘Tenha paciência.
Tudo aquilo que você deseja, se for verdadeiro, e o mais importante: se for
para ser seu, acontecerá.’
William Shakespeare
“E
é por essas e outras que me sinto ceticista demais quando dialogo contigo,
William. Você sempre encontra um meio de me contrariar, não é mesmo? Parece até
que tem um radar pros meus pessimismos amorosos, que coisa. Até confesso que
acreditaria nisso em outros dias, mas não hoje.
Não
vou negar que me peguei sorrindo lembrando de ontem, quando o menino novato me
trouxe pra casa depois do meu pequeno acidente na aula de educação física. Pode
ser bobagem, mas ele ter levado uns arranhõezinhos á sério a ponto de se
preocupar em me trazer em casa me fez pensar que... Não... Calma, né? Também
não vou começar a criar hipóteses por conta de uma carona pra casa.”
No verso da página um envelope
colado, dentro dele um cartão de natal: “Que seja sempre assim, que eu seja
sempre seu e seu sorriso sempre o meu: meu maior presente, feliz natal!”. Catarina
fica ainda mais curiosa e tenta descolar o envelope pra descobrir algum
endereço ou qualquer coisa do tipo, mas a única coisa que consegue ler em
letras já bem apagadas é: W_ng W_y, 158. Catarina não consegue completar a palavra,
mas, convencida de que se trata de alguma rua e que tal nome lhe soa familiar,
fecha o diário e volta pra casa pra procurar algo semelhante em um dos mapas de
seu pai.
Vasculhou as gavetas de seu pai a
procura de um mapa, em vinte minutos encontrou mais de seis ruas com os possíveis
nomes, mas estava disposta a descobrir a qualquer custo de onde vinha e de quem
era o tal diário. Não desistiu da busca e pensou em tentar enviar uma carta
caso conseguisse descobrir o endereço completo. Decide que amanhã mesmo
começará a procurar a tal rua.
~
~
Catarina passa a tarde inteira
lendo o diário, a cada página se envolve mais na história de vida ali descrita,
mais uma vez relê os versos escritos no postal e, por um instante, pensa que
não adiantava quantos livros, discos ou amigos possuísse, a necessidade de
viver um amor de verdade seria sempre presente. Porque aceitar seguir a vida
sem um amor é como estar preso à sombra da felicidade, se manter na superfície,
quando se pode mergulhar no oceano (sem volta) que é entrar, marcar e ter a
certeza de jamais sair da vida de alguém.
Percebe que até então passara os
últimos meses focada em seus estudos, seus afazeres domésticos e desde que
mudou para Belluno, há seis meses, sua vida amorosa estava totalmente
esquecida. Tentava lembrar-se de algum instante em que passou por sua cabeça
entrar em um relacionamento ou achar leveza no amor, mas não encontrou. O diário
despertou todas as lembranças que haviam sido esquecidas desde que deixou sua
vida, seus amigos e seus sentimentos em Sparke. Sentiu falta de seus amigos, de
suas histórias e, de repente, se viu infeliz. Era a primeira vez, desde que
havia se mudado, que dera o braço a torcer e confessou pra si mesma que não
adiantava em que cidade ela estava, há quantos quilômetros de distância ela
estivesse de sua realidade. A verdade e o destino sempre encontram um meio para
bater em nossa porta, não importa quanto tempo se corre ou quanto a si mesmo se
mude, a verdade é imutável e o amor sempre acha um caminho para continuar
existindo.
Mal pregou os olhos e já era de
manhã, acordou acabada e com seu orgulho ferido, mas isso não era motivo
suficiente para pedir um atestado para faltar aula. Trocou-se e saiu pra
escola. Ainda na rua de sua casa encontra Rodrigo e segue o caminho na
companhia dele, sem muitas palavras além de bom dia, Catarina segue todo o
caminho em silêncio, apenas escutando Rodrigo contar aventuras e estripulias
que são comuns de acontecer nos shows da banda.
Quando
eles entram na sala ela senta no mesmo lugar de sempre, Mariana ainda não
chegou e Pedro já colocou sua bolsa na cadeira ao lado da de Letícia, Rodrigo
senta na cadeira da frente da de Catarina, mas percebe que ela está calada e
não puxa papo. Como o professor ainda não tinha chegado Catarina vai para
biblioteca e procura na internet todos os nomes relacionados ao que ela
encontrou no envelope, mas não acha nada próximo de Belluno. Quando está quase
desistindo de procurar, Marcelo senta na cadeira do computador ao lado e
pergunta se ela quer ajuda, embora se assuste e, inicialmente, não queira falar
sobre isso com mais ninguém, acaba cedendo. Marcelo fala sobre uma rua próxima
à fronteira de Belluno, Catarina imediatamente lhe pede o nome da rua e eles
voltam para a sala. Durante a aula Catarina escreve um bilhete explicando que
encontrou um diário pessoal e quer muito conhecer o dono para poder
entregar-lhe, por medo de ser descoberta coloca o endereço da casa da
biblioteca como remetente, e pede que seja respondida assim que possível. Na
saída da escola passa no Correios e deixa a carta, mesmo sem muitas esperanças
de receber uma resposta, mas como Belluno não era uma cidade muito grande o
prazo de resposta não ia exceder uma semana, prometeu pra si mesma que se em
uma semana não recebesse alguma resposta, desistiria de procurar qualquer coisa
sobre o diário.
~
A sexta
feira chegou e todos os comentários na aula se resumiam à festa dos meninos,
até apostas sobre quem ficaria com mais garotas, quem beberia mais, e outras
coisas de adolescentes, mas Catarina só conseguia pensar na carta que ainda não
havia chegado, se ela havia sido recebida e imaginou 'n' hipóteses a respeito
seu destinatário. A aula passa se arrastando e quando finalmente toca Catarina
sai apressada, mas Rodrigo a acompanha e a deixa na esquina de sua casa, quando
ele dobra a rua, Catarina continua a caminhar em direção a casa da biblioteca
ainda preocupada e fica frustrada ao ver que ainda não havia chegado carta
alguma. Volta pra casa e passa a tarde inteira estudando para se preparar para
semana de provas que viria. No final da tarde decide voltar na casa para
conferir se havia chegado alguma coisa, abre a caixa de correios já sem
esperanças, mas fica espantada quando vê que tem um pacote ali dentro. Pega o
pacote e entra correndo na casa, senta na escada atônita e curiosa para saber o
que havia ali dentro, quando abre...
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