Mais
uma noite entre sono retido, números discados, celulares fora de área ou
desligado, sonhos nostálgicos, saudades dos dias em Sparke... Catarina reluta
em levantar da cama, sem motivação, sem forças, sem ânimo e com olheiras de
sobra. Não lembrava muito bem o que tinha feito no dia anterior, mas como foi
domingo deduziu que seu dia se resumiu a estudar e dormir, exatamente como foi.
O sábado foi sim traumático, não só pra Mariana, mas para todos que
presenciaram o que Pedro fez com a coitada. Não precisa nem dizer qual vai ser
a pauta das conversas em sala de hoje.
Rodrigo,
no caminho pra escola, tenta não mencionar nada da festa ou do que houve
depois, mas não resiste e cinco minutos depois já começa a falar
descontroladamente tentando defender Pedro pra tentar limpar sua imagem pelo
menos com Catarina. Não que detestasse Pedro ou qualquer coisa do tipo, mas
Catarina discordava de muitos pontos na personalidade dele e reprovava grande
parte de suas atitudes, principalmente quando se referia ao modo como ele
tratava Mariana.
– Não
foi intencional cantar a mesma música que tinha oferecido pra Mariana meses
atrás. Ele se arrependeu do que fez porque depois do show Letícia falou que
queria acabar tudo porque ela percebeu que ele só queria usá-la pra provocar
ciúmes em Mariana... Ninguém tenta entender o lado dele também. - tenta
explicar Rodrigo.
– Entender
o lado dele? Rodrigo... Desde que cheguei só vejo Pedro brincar com os
sentimentos de Mariana, se ele não quer nada sério com ela, deveria deixar bem
claro e colocar um basta nisso, já que sabe que ela não consegue. Mas não, ele
continua dando esperanças a ela como se um dia fosse ter alguma coisa com ela.
– Então
a burra na história é ela, Catarina! Se sabe disso tudo por que ainda deixa ele
fazer essa palhaçada com ela?
– Porque
ela ama. E amar tem dessas coisas Rodrigo... Você doa seu bem estar pra
garantir estar com seu bem. É um preço bem injusto, mas a felicidade de ficar
perto de quem a gente gosta compensa quase todo sacrifício.
– Essa
não é a Catarina que eu conheço, esse fim de semana te deixou romântica demais...
Que droga - Catarina o empurra e os dois riem, dando conta de que já estavam na
frente da escola.
–
Qualé! Vamos entrar que uma manhã tensa nos espera, senhor defensor.
– Pois
sim, senhorita piegas.
Quando entram na sala os grupos
já estavam formados e não se fala de outra coisa a não ser do fracasso da
festa. Do lado esquerdo Marcelo e os meninos da banda comenta sobre quem mais
bebeu, quem ficou com quem. Do lado direito as meninas comentam sobre os
meninos novos da cidade, quem usou a melhor roupa... E, no centro, Letícia e as
amigas fazendo de tudo para não tocar no assunto "festa".
Catarina
e Rodrigo caminham na direção de Pedro, nas últimas cadeiras, deitado por cima
da mochila, tentando recuperar o sono do sim de semana. Rodrigo senta do seu
lado, remexendo seu cabelo para acordá-lo, Catarina senta do outro lado e tira
um livro da bolsa pra esconder o interesse na conversa. Instantes depois,
Mariana chega de mãos dadas com Bernardo e todas as conversas cessam. Todos
param pra observar o suposto casal novo caminhar e sentar nas cadeiras do meio.
Pedro imediatamente se levanta e vai à direção dos dois, olha pra Mariana e a
pede pra falar com ele no corredor.
– Que
palhaçada é essa Mariana? Quer me explicar isso?!
–
Explicar o quê Pedro? Não tenho satisfações pra lhe dar do que eu faço ou deixo
de fazer.
–
Mariana... Você vai deixar tudo o que a gente tem pra trás por causa de um
deslize meu?
– Um
deslize? Pedro, eu não tenho mais coragem nem coração pra continuar nisso!
Cansei de ter as coisas pela metade, me contentar com as migalhas de sua
atenção, da sua consideração, do seu amor... Eu dei tudo de mim por nós dois e
você? O que fez? Jogou tudo no lixo e quebrou meu coração.
–
Mariana, você sabe que estamos numa fase complicada, mas não é assim... Eu
gosto muito de você... De ficar contigo... Não faz isso, velho.
– Viu?
Você gosta, você fica na mesma superfície... EU TE AMO PEDRO! Quando é que você
vai entender?
– Eu
também! Viu? Nós somos ótimos juntos, meu amor...
– Hm...
Nós... Nunca houve nenhum nós. E agora acabou, entende? A-ca-bou! Siga sua vida
e me deixe seguir a minha. Já retrocedi muito ela por sua causa.
– Com
Bernardo? É ele que tu quer que eu deixe conduzir tua vida? Eu nunca vou me
permitir te perder pra ele Mariana. Nunca!
– Então
se contente, porque você já perdeu. E não tem volta Pedro. - Ele segura nas
mãos dela e diz calmo: "Mariana... Não faz isso com a gente, por
favor...".
– Adeus
Pedro.
Mariana
se vira e entra na sala. Pedro fica no corredor desacreditado no que acabara de
ouvir, não é possível que ela tenha mudado tanto, não é admissível perder tudo
dessa maneira. O professor chega e manda todos entrarem na sala pra começar a
aula. Porém Pedro pega suas coisas e vai pra casa.
Catarina
não compreende as atitudes de Pedro e até fica brava com Rodrigo por estar
sempre defendendo e encobertando as coisas erradas que ele faz. No intervalo
Mariana vem lhe agradecer pelo apoio que ela lhe deu na festa e por ter se
importado com ela, mesmo sem ter tanta proximidade assim.
– Que
isso Mariana, eu ajudaria qualquer pessoa na sua condição, isso não se faz.
– Eu
sei, mas mesmo assim muito obrigada e me desculpa pelos meus tratamentos com
você antes... de verdade.
– Tranquilo
garota. Mas e então, você e Bernardo...?
– Ah
não. Não, não.
– Vocês
saindo do clube juntos e entrando de mãos dadas na aula... Ficou bem casal.
– Eu
não faria isso com ele, sabe? Eu sei que ele gosta de mim, mas não posso usá-lo
como escape e também, ele tem sido muito legal comigo, muito mesmo.
– Entendo...
~
No fim
da aula Catarina volta a pensar no diário, na carta agressiva que recebeu e
pensa que não pode deixar isso pra trás assim, logo de primeira. Se a pessoa
que escreveu o diário for a mesma a quem as cartas estão sendo entregues, ela
vai compreender. Tinha certeza que ia. Assim que chega em casa começa a
escrever:
“Não sei o que disse na outra carta que
deixou você tão revoltada, mas não foi minha intenção. Eu realmente quero saber
quem escreveu o diário pois achei coisas muito bonitas escritas nele e me
identifiquei com muitas coisas descritas ali. Se o diário é seu, gostaria de
compartilhar muitas coisas com você, além de um ótimo gosto literário a sua história de amor descrita nele é muito
parecida com uma história minha, só que com um final meio que diferente...
Só quero conversar, nada mais que isso. Mas se você não quiser, eu
compreendo. Caso contrário, sempre vou na casa do endereço aqui no envelope, se
quiser me responder, ficarei muito grata.”
Catarina não esperava receber a
resposta muito cedo, mas foi enviar o quanto antes.
Passou a noite pensando nos
últimos acontecimentos: a festa, a conversa de Pedro e Mariana, ou pelo menos
havia tentado pensar. Mas nada lhe permitia ficar mais que dez minutos sem
pensar no diário, em quem escrevia e se a pessoa que lhe respondera era
realmente o dono do diário.
No outro dia foi à escola e
praticamente ninguém havia ido. Rodrigo contou-lhe que Pedro já havia dito que
não iria, porque ainda achava que Mariana estava com Bernardo. Bernardo e
Marcelo haviam viajado juntos e só voltariam pra Belluno de noite, Letícia e
suas amigas faltaram aula pra ir ao shopping. Com isso não havia como o dia na
escola não ser tranquilo. Mas mesmo assim as aulas fizeram questão de se
arrastar. Catarina já não aguentava mais ouvir aquele professor falar da
Segunda Guerra Mundial quando o sinal finalmente toca.
Catarina vai pra casa acompanhada
por Rodrigo, se despede e corre pra dentro de casa pra falar com sua mãe, mas
percebe que ela não está. Decide então ir à casa secreta pegar algum disco ou
livro. Quando chega na esquina, a primeira coisa que vê é o carteiro saindo de
lá. Corre para ver se é a resposta, quando chega lá percebe que é um envelope e
abre:
Primeiramente,
desculpe-me por ter sido grossa daquela maneira, achei que era algum
engraçadinho querendo fazer algum tipo de piadinha comigo. Sim, você disse que
encontrou meu diário, como? Eu o guardava aqui e faz, eu acho, que uns três
anos que ele sumiu e eu parei de escrever. Se puder me devolver, por favor, eu
agradeceria. Ele me traz muitas lembranças da minha vida, boas e ruins.
Sobre
o meu amor ser lindo, obrigada. Mas saiba que esse meu amor foi forte, mas não
mais forte que tudo. Acho que a natureza não gosta muito de mim, ela importuna
minha vida, traz saudade, mais amor e menos meu amor.
Mais
uma vez, me desculpe. Não queria ter passado uma imagem de revoltada, mas são
as circunstâncias que mexem com a gente sem percebermos.
Responda
logo,
L. D.
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário